quinta-feira, 5 de maio de 2011

João e o Tempo

Na época em que o Rei Chronos governava, o Tempo era como uma religião. No Templo principal de Minutto, capital do reino, havia um relógio imenso dourado com ponteiros que brilhavam durante a noite e em toda esquina da cidade havia um pequeno relógio em formato quadrado com números coloridos e ponteiros brancos. Todos naquele reino usavam um relógio de pulso ou de bolso, o importante era que usassem um relógio. A vestimenta da Guarda Real era lilás com uma ampulheta dourada desenhada no peito e de hora em hora o grande relógio principal tocava com som estridente que se ouvia além das terras de Minutto. Também tocavam o relógio em cada atividade comum obrigatória naquele reino, por exemplo, todos almoçavam exatamente ao meio dia. Naquele pequeno reino todos viviam o Tempo.

Num vilarejo perto da Floresta Horrenda vivia João. Ele era um jovem com grande conhecimento, mas que sempre perdia as horas. Quando se concentrava em algo esquecia de tudo, inclusive do Tempo. Porém, naquele reino ou melhor naquele reinado, esquecer do Tempo era considerado um crime, por isso João nunca aceitou muito bem ter suas atividades controladas por um Rei. Ele sempre discutia com as pessoas sobre como poderiam ser chamados de livres se não tinham liberdade de controlar seu tempo e se submetiam a um Rei que mais parecia um Imperador. Um Imperador do Tempo.

O reino era pequeno e bem controlado, assim Rei Chronos sabia de tudo que acontecia e soube que um agitador político chamado João planejava uma revolução. Mandou então uma tropa buscar tão ousado jovem que lhe desafiava. No vilarejo João foi abordado pelos soldados da Guarda Real, que o prendeu e mandou que os acompanhassem. Sem saber o que estava acontecendo ele seguiu os soldados até o Palácio Real na presença do Imperador do Tempo, como João o chamava. Na presença do Rei, João se curvou esperando uma explicação para sua presença ali.

- Então tu és João, o agitador? – Perguntou o Rei

- Não compreendo o que dizes, Vossa Majestade- Disse João, preocupado com que rumo tomaria aquela conversa.

- Soube que queres fazer uma revolução contra meu reinado. – Insistiu Chronos

- Vossa Majestade – disse o garoto tão calmo como as águas de um lago- Só desejo como qualquer cidadão do reino, ter direito de controlar o meu tempo e não de ser controlado por ele.

- É um absurdo o que esse garoto fala. Leve-o para o calabouço e dê a ele a punição do ponteiro para que ele entenda a respeitar as leis. E depois de amanha traga-o até a minha presença. – Ordenou o Rei.

João seguiu os guardas e nem imaginava o que seria a punição do ponteiro. Só de pensar nas possibilidades ele tremia.Chegaram até o calabouço escuro e sujo, então levaram o garoto para uma pequena sala onde havia dezenas de relógios e os tic tacs dos ponteiros eram constantes, além extremamente altos. Em meio aquele ambiente perturbador, deixaram o pobre João.

TIC TAC, TIC TAC , TIC TAC... eram dezenas de relógios com segundos atrasados o que tornava tudo mais difícil de tolerar. E foram exatamente 48 horas de tortura com tic tacs desalinhados. O jovem não conseguia mais pensar, a cabeça estava quase estourando de tanta dor. Então o Rei Chronos mandou que o chamassem até sua presença. Para João foi um alivio, porém seria muito fraco da parte dele se desistisse ali e agora pelo o que tanto lutou e sonhou.

- Garoto, agora entende o poder o Tempo? – Perguntou o Rei Chronos

- Vossa Majestade, agora somente entendo o poder da tirania de um Imperador – Disse ele tremendo, mas arriscando.

- Como ousa falar assim com um Rei? Um Rei tão bom que teve misericórdia da sua vida mesmo sabendo que planejava contra a minha.

- Senhor, jamais tentei contra a sua vida. Apenas lutei pelo o que sempre acreditei. – Disse o jovem com segurança.

- Guardas! Levem esse garoto para o calabouço e preparem seu enforcamento pela manhã!- Exclamou o Rei furioso.

- Meu Senhor- gritou o jovem- Se acredita mesmo no poder do Tempo, eu o desafio a um duelo. Mas se tem medo de morrer na mão de um garoto, entendo que não queira arriscar.

Isso deixou o Rei ainda mais furioso, como um jovem ousava a falar assim com Rei? Tentar contra a moral de um soberano era sempre um erro. Um erro fatal. E João sabia disso, porém não tinha nada a perder.

O Rei Chronos não era velho, por outro lado, era um Rei ainda forte, ja havia guerreado e era conhecedor da arte de manejar uma espada. Por isso João estava nervoso e até alguns soldados estavam com pena daquele garoto que fora tão corajoso desafiando as leis do Rei Tirano.

Amanheceu. Era o dia da luta. Milhares de pessoas estavam lá, inclusive a familia de João. O Rei Chronos se preparava em seus aposentos Reais enquanto João recebia do chefe da Guarda, uma espada.

- Boa sorte garoto- Disse o chefe

-Torcendo contra seu Rei? – Perguntou João

- Você sabe que ninguém queria isso, porem ele é o Rei aqui. E ninguém foi corajoso o bastante para enfrenta-lo, nem mesmo eu ou um dos meus soldados.

João arregalou os olhos e engoliu seco. Seu nome havia sido anunciado.

Havia uma arena para isso e João entrou sob o silêncio de todos. Ele não sabia se o silêncio era de medo de torcer por ele, indo contra o Rei ou pena por um garoto tão jovem morrer assim. O Rei entrou triunfante. Uma capa lilás cobria a roupa de luta e ele usava um cinturão com ampulhetas desenhadas.

- Povo de Minutto e além desta cidade. Eu e esse garoto lutaremos hoje até a morte, para que se prove o poder do Tempo. Sou tão justo – disse o Rei com deboche explicito- que vencedor desta luta será Rei. Se eu vencer continuarei meu reinado como sempre foi e sempre será e o próximo que me desafiar será enforcado sem ter a chance de se defender. Mas se o nosso jovem aqui vencer – ele fez uma pausa rindo sutilmente acompanhado por outros soldados que o apoiavam- ele será o novo Rei e governará como acha que deve ser feito.

- Que se inicie a Luta – Gritou o anunciante.

O Rei olhava para João como um tigre olha para sua presa. Eles andavam em circulos e João mal conseguia segurar sua espada. Chronos tentou um ataque e o garoto desviou no susto. O Rei tentou mais outro ataque e quase o acertou fazendo com que João caísse no chão e o jovem se levantou rapidamente antes que a terceira investida do Rei fosse fatal. Os olhos assustados do garoto davam pena, todos acompanhavam a luta com o coração apertado pois aquela luta poderia ser o inicio de uma Nova Era, para bem ou para mal.

A luta se resumia em o ataque do rei e defesa do jovem, sendo que muitas vezes João mais se esquivava do que defendia. Os dois ja estavam esgotados com o duelo, porém não podiam desistir, apesar de todos acreditarem que uma hora João não iria mais conseguir se defender. Mas algo inesperado aconteceu, tão inesperado que todos se assustaram. O sinal do Grande Relógio soou mais estridente do que nunca. O Rei acostumado sempre a saber que horas eram e esperar o soar do Relógio, se assustou pois estava distraído com a batalha. João por sua vez que sempre se distraia e não prestava muita atenção nas horas, se manteve empenhado e concentrado na luta. Nesse momento surgiu a unica oportunidade que João tivera naquela luta e ele atacou com a maior força e rapidez que conseguiu. Rei Chronos caiu ajoelhado urrando e sangrando. No chão, quase morto, ele amaldiçoou João com todas pragas possíveis.

O garoto estava mais assustado do que contente. O povo se manteve em um silêncio que até que pareciam mais estátuas do que homens. Nesse momento o Chefe da Guarda se ajoelhou perante João, logo após ele os demais soldados e todo povo se curvou gritando vida longa ao novo Rei.

João foi nomeado Rei João, o Sem Tempo, pois ele fora o primeiro que tirar o relógio do pulso. Sabe-se que ele não obrigou que as outras pessoas fizessem o mesmo, deixando a critério de cada um no reino. Quanto ao Grande Relógio no Templo, ele foi tirado de lá e no lugar colocaram-se belas esculturas. O nome da cidade continuou o mesmo, mas todos relógios públicos foram tirados. A Guarda Real teve seu uniforme redesenhado. E foi a partir daquele novo reinado que ninguém mais precisaria ser controlado pelo tempo e eles se tornaram verdadeiramente livres.

Fim

5 comentários:

  1. Quando sai a segunda parte?
    Estou curioso pra saber o que é a punição do ponteiro!

    Ótimo texto, parabéns!

    ResponderExcluir
  2. Terminei o texto já... eu iria dividir em 2 partes mas achei q ficaria confuso.. então resolvi editar colocando o final nesse mesmo post.
    Bjos.. obrigada!

    ResponderExcluir
  3. a narrativa é otima, muita criatividade eim?
    parabens \o

    ResponderExcluir
  4. Nossaaaa dos seuss textosss esse é o melhorrr !! Um texto que temm cara de começoooo :D Essaaa históriaa tem muitoo futurooo !! Me lembraa as Crosnicas de Narmiaa :D
    Beijos no coração queridaaa
    QUE DEUS E JESUS SEMPRE TE ILUMINEM E GUIEM

    ResponderExcluir
  5. Final feliz! (Feliz?)
    Há muito não via uma história com final "feliz" (ou melhor, que terminou bem para quem começou mal). É muito bom o texto! Gostei! Continue escrevendo.

    ResponderExcluir